quinta-feira, 13 de dezembro de 2012

OS FENÔMENOS ASIÁTICOS


Tarcísio Brandão de Vilhena

Muito se tem falado ultimamente sobre assimilação à cultura ocidental pelos os Asiáticos. Na música erudita sempre surgem instrumentistas que alcançam o estrelato. Três são os paises que mais contribuem ao surgimento de pianista ou violinistas que se dedicam à interpretação da musica erudita ocidental. A China é o país com consideravel número de instrumentistas, seguida pelo Japão e Coréa do Sul, cuja orquestra Filarmônica de Seul alcançou renome internacional. Alguns maestros asiáticos chegaram ao estrelato como o Sul Coreano, Myung-Whom Cung, maestro titular da Filarmônica de Seul, dono de uma técnica impecável e de notável sensibilidade na condução de partituras dificeis como as de Mahler, cuja leitura ele a faz levando-se em conta todas as matizes da musica, procurando interpretá-la tendo-se em conta aquilo que o compositor se dispôs expressar.
Entre os vários instrumentista Asiáticos, destaco tês pianistas Chineses que alcançaram fama internacional: Youndi Li, Lang Lang e Yuja Wan.
Yundi Li é o mais virtuoso dos três e com uma extraordinária técnica. Ele não auto se promove como Lang Lang o faz, resultado é uma musica de melhor qualidade, reconhecida por quem realmente importa e entende. Lang Lang, o que está mais em evidência, não sacraliza a música clássica. Veste cores fortes nos concertos e lançou até um tênis com seu nome. Viaja em seu jato particular. É a ponta de lança de um processo musical muito mais amplo pela expansão da influência chinesa no mundo do que pelos os seus méritos musicais.

Na verdade, esses interpretes asiáticos estão longe de alcançarem o refinamento de Marta Argerich e de Nelson Freire, não se falando no extraordinário refinamento e no alto rigor técnico de Maurizio Pollini. interprete extremamente intelectual.

Só um país com 1,3 bilhão de habitantes poderia ter 100 milhões de estudantes de música – e de fãs potenciais do compatriota Lang Lang, venerado pelos adolescentes chineses, é, aos 29 anos, um dos pianistas mais bem remunerado do mundo.
Aos olhos do Ocidente, Lang Lang estreou em 1997, ao gravar para o selo independente norte-americano Telarc. Logo foi contratado pela Deutsche Grammophon e, há pouco mais de um ano, transferiu-se para a Sony, o que lhe rendeu luvas de 3 milhões de dólares.
Lang Lang é uma espécie de bilhete premiado. Se 1% da população chinesa comprar um de seus CDs, o investimento estará pago pelas próximas décadas, segundo especialistas. Essa expectativa não é exagerada: ela se baseia no fato de que, na China, a música clássica tem uma imagem de juventude, parecida com a do pop no resto do mundo.
Lang Lang já tem seu próprio modelo de tênis Adidas, em tiragem especial de 100 mil pares. Nas apresentações, ele veste paletós acintosamente acetinados, de tons vivíssimos. Em resumo: é o que o público chinês quer consumir. Martha Argerich e Nelson Freire jamais gravariam, como fez Lang Lang, o vídeo, visto por 1,7 milhão de pessoas no YouTube, em que toca um trecho do Concerto Nº 3 de Prokofiev – justamente a peça que celebrizou a pianista argentina. O músico intercala sua performance com gestos de kung fu inspirados nos jogos de videogam. É hilário, engraçado, vivo. Lang Lang adora a música clássica, mas não a SACRALIZA.
Ele toca como um ginasta, uma máquina. Aliás, excetuando-se Yundi Li, dono de uma apurada técnica e de extraordinário vistuosismo - essa é uma caracterista dos pianista asiáticos, sejam eles os Chineses ou Sul Coreanos. Yuja Wan celerizou-se pela velocidade, é a pianista que consegue o maior numero de notas por segundo. Faltam-lhes, entretanto, sensibilidade na interpretação de obras como principalmente as de Chopin que exige alem de uma apurada técnica, necessita de alma, coisa que, ao que parece, não compõe a cultura asiática..
Tecnicamente, Lang Lang é irrepreensível, como tambem Yuja Wang o é. O problema está no que os críticos identificam como ingenuidade artística. Ambos entende a música clássica ocidental como uma técnica. E isso, provalvelmente, tem a ver com a história.
Pesquisando, vim a saber que o jesuíta italiano Matteo Ricci desembarcou em Pequim no ano de 1601, disposto a iniciar a cristianização da China, trazia um cravo de presente para o imperador Wanli, da dinastia Ming. Ricci esperou nove anos até ser recebido na Cidade Imperial. Ao ver o desconhecido instrumento, o soberano encantou-se e quis ter aulas. Outros jesuítas instalaram órgãos de igreja por lá. Era o primeiro contato dos chineses com a música clássica ocidental. No século seguinte, o imperador Kangxi aprendeu a tocar cravo e fez publicar um manual com ensinamentos ocidentais e chineses lado a lado. Mais tarde, o imperador Qianlong chegou a ter seu exército de eunucos cantando como os "castrati italianos".
Porem, o impulso decisivo para o desenvolvimento da música clássica na China foi a chegada a Xangai de refugiados russos, entre eles czaristas e judeus, expulsos pela Revolução de 1917. No ano seguinte, aportou na cidade o pianista e maestro italiano Mario Paci, que, doente, lá permaneceu e acabou montando a primeira orquestra de música ocidental da China. Décadas depois, a expansão do gênero foi interrompida, no único episódio histórico em que o piano foi banido de um país – no caso, pela Revolução Cultural de Mao Tsé-Tung, que, entre 1966 e 1976, destruiu instrumentos e partituras. Dezenas de professores dos conservatórios se suicidaram e sinfonias ocidentais só voltaram a ser executadas após a morte de Mao.
De lá para cá, o piano paulatinamente deixou de ser um “corpo estranho”. Hoje, é responsável pelo “grande salto” do país na área musical. O maior boom do instrumento no mundo se deu justamente via Lang Lang. Quase tudo na China tem dimensões monumentais, e a música clássica não é mais exceção. O Conservatório de Sichuan, em Chengdu, que possui 800 salas para estudo de piano, está concluindo uma ambiciosa ampliação, que o deixará com 10 mil. É um dos nove megaconservatórios do país, para onde se encaminham os aspirantes a Lang Lang. Seu instrumento está em primeiro lugar na preferência dos estudantes chineses, seguido por violino e violoncelo – estima-se em 50 milhões o total de crianças e adolescentes martelando diariamente pianos de armário. Se isso garante um mercado gigante, representa também uma concorrência terrível. Desde muito cedo, Lang Lang mentalizou que precisaria ser “o número 1”. A família pobre investiu o que tinha e o que não tinha. O pai largou o emprego e a mãe sustentou marido e filho em Pequim com um salário de telefonista em Shenyang.
"É não apenas curioso mas também sintomático que a educação musical chinesa seja famosa pelo método Suzuki, de treinamento mecânico baseado em repetição e memorização".
Quando se fixou nos Estados Unidos, Lang Lang foi criticado por ter técnica demais e sentimento de menos – ouviu isso nas aulas do pianista e regente Daniel Barenboim. Resultado: "o chinês logo se bandeou para os maneirismos exagerados. "Tornou-se over". "Em vez de uma lágrima, chora convulsivamente ao piano. Em vez de um meio sorriso, estoura em gargalhadas, como se o público precisasse de doses exageradas de emoção e virtuosismo para se interessar pelo que rola no palco". “Quero reproduzir a sensação do balanço de Tiger Woods e da enterrada de Michael Jordan”, explica. De que ele sabe tocar piano, ninguém duvida. Que ele e Yuja Wan têm uma técnica fenomenal, superlativa, também é óbvio. Falta no caso de Lang Lang, controlar os excessos. Mas, se justamente os excessos – tanto ao piano quanto no modo de se vestirem.
Yuja Wang com decotes generosos e saias curtissimas exibindo as pernas. Consta que Yuja ao se apresntar com um vestido curtissimo, como solista do concerto nº II para Piano e Orquestra de Rachmaninov, provocou a reação dos musicos sob alegação que a sua vestimenta prejudicava a concentração dos músicos.
Se as maneiras de Lang Lang constituem a razão de seu sucesso planetário, não seria o caso de nos perguntarmos o que sua maneira de tocar diz sobre nós mesmos”?
Ela indicaria que somos parte de uma sociedade do espetáculo, em que o show não pode parar – e as novíssimas atrações precisam se suceder vertiginosamente, cada uma mais extravagante e bizarra que a anterior. Engrenagem perversa, em que tudo se faz para chamar a atenção de nossos ouvidos. Em sua precoce autobiografia, Lang Lang diz que, em 2000, aos 18 anos, teve uma das maiores emoções de sua vida: “Eu faria os concertos em seguida às apresentações de Evgeny Kissin, um pianista russo dez anos mais velho, que eu adorava desde garotinho. Kissin ocupava a sala de estudos próxima à minha e fiquei empolgado por estar perto do homem que admirava tanto”. Mas Kissin pertence a formidável escola Russa só isso ja é o bastante.


sexta-feira, 2 de novembro de 2012

Coluna de Nelson - ( 1840/43)



 

Coluna de Nelson (184/43): Semana dos Monumentos


 
Houve um tempo em que o mapa-múndi era quase todo da mesma cor. Era grande o orgulho da rainha Vitória ao olhar o Atlas e ver a cor rosa indicando as terras que pertenciam ao Império Britânico.

E Londres, capital desse império, era seu centro político e econômico.


segunda-feira, 29 de outubro de 2012

Coluna de Trajano (113 d.C.)


A Coluna de Trajano foi erguida para comemorar a conquista da Dácia (território às margens do Danúbio, hoje Romênia), uma grande vitória do Imperador Trajano. Em ordem absolutamente cronológica, estão esculpidas na coluna as diversas etapas da guerra.

Esse tipo de coluna, criado pelos romanos que o chamaram de “coclide” (nome que se origina na palavra “chioccola”, caracol) tem as seguintes características: o fusto (ou corpo) é composto por 18 blocos em mármore de Carrara e é decorado por uma frisa contínua em baixo-relevo, com 200 metros de comprimento, e que o envolve em espiral até o topo.


terça-feira, 16 de outubro de 2012

Santuário Histórico de Machu Picchu


 
Em 1911, o arqueólogo Hiram Bingham III, professor-assistente na Universidade de Yale, numa expedição à procura de Vilcabamba, última capital inca antes da derrota definitiva para os espanhóis, em 1572, conheceu essa fantástica cidadela.


Estava coberta por densa vegetação, mas foi possível ver que as construções eram feitas com as pedras cortadas com precisão e encaixadas sem necessidade de argamassa, o que era típico dos incas.
Tudo indica que o local não fora visitado pelo conquistador espanhol, pois estava intacto. Quando se diz que Bingham descobriu Machu Picchu, o que se quer dizer é descobrir para o mundo, pois lá viviam duas famílias de camponeses peruanos há algumas gerações.

À esquerda foto tirada em 1911, de um dos ajudantes de Bingham, no subsolo do Templo do Sol, do qual ainda falaremos.
Após longas pesquisas, somente uma única referência a Machu Picchu foi encontrada em documentos espanhóis, justamente a palavra Picchu em um texto datado de 1568, dando a compreender que era palavra para designar o imperador inca.
Acredita-se que a cidadela foi erguida por Pachacuti Inca Yupanqui (1438/1470), o nono soberano dos Incas, em meados do século XV. Um construtor de impérios, Pacachuti deu início a uma série de conquistas que veriam seu império ocupar uma vasta extensão da América do Sul, desde o Equador até o Chile.
Localizada a leste da Cordilheira dos Andes, nas margens da floresta amazônica, Machu Picchu fica na província de Urubamba, a 100 kilômetros de Cusco, a Capital Histórica do Peru, como é por direito conhecida. Já falamos em sua linda praça, mas devemos uma semana a Cusco.
As ruínas estão no canyon formado pelo rio Urubamba (foto abaixo), que contorna as duas montanhas que estão a 2438 m de altitude. Uma das montanhas é Huayna Picchu, que em qechua, linguagem dos incas, quer dizer montanha jovem. É essa montanha, que domina a cidadela, que se tornou representativa do local, pois a cidadela está a seu pés.

De alguns ângulos dizem que é possível perceber a forma de um rosto humano no topo de Huayna, a olhar para o céu, sendo que o pico da montanha seria o nariz...
No entanto, é sobre o topo de Machu Picchu, cujo significado é montanha velha, que a cidadela foi erguida. E assim ficou conhecida no mundo inteiro. Hoje Patrimônio da Humanidade, Machu Picchu é um dos mais procurados centros de turismo. Ainda bem que há leis severas a protegê-la...


Como fiquei muito tempo sentada nesse abrigo (foto acima) para "beber" a paisagem com os olhos, gosto de acreditar que Bingham fez o mesmo e, provavelmente, chorando de emoção. Eu confesso que chorei de emoção e também de dor: os mosquitos "incas" têm dentes serrilhados, só pode ser, tal a devastação que fizeram em minhas pernas, apesar de toda a indumentária e remédios para afastar os monstrinhos. Ainda voltarei ao assunto, para falar dos turistas alemães e ingleses, uns abnegados.
















sábado, 13 de outubro de 2012

OS MARGINAIS DO PODER

MARCO ANTONIO VILLA - HISTORIADOR. É PROFESSOR DA UNIVERSIDADE FEDERAL DE SÃO CARLOS

Vivemos um tempo curioso, estranho. A refundação da República está ocorrendo e poucos se estão dando conta deste momento histórico. Momento histórico, sim. O Supremo Tribunal Federal (STF), simplesmente observando e cumprindo os dispositivos legais, está recolocando a República de pé. Mariana - símbolo da República Francesa e de tantas outras, e que orna nossos edifícios públicos, assim como nossas moedas - havia sido esquecida, desprezada. No célebre quadro de Eugène Delacroix, é ela que guia o povo rumo à conquista da liberdade. No Brasil, Mariana acabou se perdendo nos meandros da corrupção. Viu, desiludida, que estava até perdendo espaço na simbologia republicana, sendo substituída pela mala - a mala recheada de dinheiro furtado do erário.

Na condenação dos mensaleiros e da liderança petista, os votos dos ministros do STF têm a importância dos escritos dos propagandistas da República. Fica a impressão de que Silva Jardim, Saldanha Marinho, Júlio Ribeiro, Euclides da Cunha, Quintino Bocayuva, entre tantos outros, estão de volta. Como se o Manifesto Republicano de dezembro de 1870 estivesse sendo reescrito, ampliado e devidamente atualizado. Mas tudo de forma tranquila, sem exaltação ou grandes reuniões.
O ministro Celso de Mello, decano do STF, foi muito feliz quando considerou os mensaleiros marginais do poder. São marginais do poder, sim. Como disse o mesmo ministro, "estamos tratando de macrodelinquência governamental, da utilização abusiva, criminosa, do aparato governamental ou do aparato partidário por seus próprios dirigentes". E foi completado pelo presidente Carlos Ayres Brito, que definiu a ação do PT como "um projeto de poder quadrienalmente quadruplicado. Projeto de poder de continuísmo seco, raso. Golpe, portanto". Foram palavras duras, mas precisas. Apontaram com crueza o significado destrutivo da estratégia de um partido que desejava tomar para si o aparelho de Estado de forma golpista, não pelas armas, mas usando o Tesouro como instrumento de convencimento, trocando as balas assassinas pelo dinheiro sujo.
A condenação por corrupção ativa da liderança petista - e por nove vezes - representaria, em qualquer país democrático, uma espécie de dobre de finados. Não há no Ocidente, na História recente, nenhum partido que tenha sido atingido tão duramente como foi o PT. O núcleo do partido foi considerado golpista, líder de "uma grande organização criminosa que se posiciona à sombra do poder", nas palavras do decano. E foi severamente condenado pelos ministros.
Mas, como se nada tivesse acontecido, como se o PT tivesse sido absolvido de todas as imputações, a presidente Dilma Rousseff, na quarta-feira, deslocou-se de Brasília a São Paulo, no horário do expediente, para, durante quatro horas, se reunir com Luiz Inácio Lula da Silva, simples cidadão e sem nenhum cargo partidário, tratando das eleições municipais. O leitor não leu mal. É isso mesmo: durante o horário de trabalho, com toda a estrutura da Presidência da República, ela veio a São Paulo ouvir piedosamente o oráculo de São Bernardo do Campo. É inacreditável, além de uma cruel ironia, diante das condenações pelo STF do núcleo duro do partido da presidente. Foi uma gigantesca demonstração de desprezo pela decisão da Suprema Corte. E ainda dizem que Dilma é mais "institucional" que Lula...
Com o tempo vão ficando mais nítidas as razões do ex-presidente para pressionar o STF a fim de que não corresse o julgamento. Afinal, ele sabia de todas as tratativas, conhecia detalhadamente o processo de mais de 50 mil páginas sem ter lido uma sequer. Conhecia porque foi o principal beneficiário de todas aquelas ações. E isso é rotineiramente esquecido. Afinal, o projeto continuísta de poder era para quem permanecer à frente do governo? A "sofisticada organização criminosa", nas palavras de Roberto Gurgel, o procurador-geral da República, foi criada para beneficiar qual presidente? Na reunião realizada em Brasília, em 2002, que levou à "compra" do Partido Liberal por R$ 10 milhões, Lula não estava presente? Estava. E quando disse - especialmente quando saiu da Presidência - que não existiu o mensalão, que tudo era uma farsa? E agora, com as decisões e condenações do STF, quem está mentindo? Lula considera o STF farsante? Quem é o farsante, ele ou os ministros da Suprema Corte?
Como bem apontou o ministro Joaquim Barbosa, relator do processo, o desprezo pelos valores republicanos chegou a tal ponto que ocorreram reuniões clandestinas no Palácio do Planalto. Isso mesmo, reuniões clandestinas. Desde que foi proclamada a República, passando pelas sedes do Executivo nacional no Rio de Janeiro (o Palácio do Itamaraty até 1897 e, depois, o Palácio do Catete até 1960), nunca na História deste país, como gosta de dizer o ex-presidente Lula, foram realizadas na sede do governo reuniões desse jaez, por aqueles que entendiam (e entendem) a política motivados "por práticas criminosas perpetradas à sombra do poder", nas felizes, oportunas e tristemente corretas palavras de Celso de Mello.
A presidente da República deveria dar alguma declaração sobre as condenações. Não dá para fingir que nada aconteceu. Afinal, são líderes do seu partido. José Dirceu, o "chefe da quadrilha", segundo Roberto Gurgel, quando transferiu a chefia da Casa Civil para ela, em 2005, chamou-a de "companheira de armas". Mas o silêncio ensurdecedor de Dilma é até compreensível. Faz parte da "ética" petista.
Triste é a omissão da oposição. Teme usar o mensalão na campanha eleitoral. Não consegue associar corrupção ao agravamento das condições de miséria da população mais pobre, como fez o ministro Luiz Fux num de seus votos. É oposição?



terça-feira, 2 de outubro de 2012

VISÃO REPUBLICANA

 Merval Pereira


O 30º dia do julgamento do mensalão pelo Supremo Tribunal Federal trouxe duas definições fundamentais para o aperfeiçoamento da democracia brasileira: a maioria do plenário formalizou o entendimento de que houve compra de apoio político no Congresso por parte do Executivo, e o ministro Celso de Mello denunciou que essa prática, inaceitável, coloca em risco o equilíbrio entre os poderes da República.
O decano do STF pronunciou um dos votos mais importantes não só do processo em julgamento, mas da história do STF, definindo que “o Estado brasileiro não tolera o poder que corrompe e nem admite o poder que se deixa corromper”.
Também o presidente da Corte, Carlos Ayres Britto, deu a dimensão da gravidade do esquema criminoso que está sendo julgado ao concordar que ele é representativo “de poder ideológico partidário”, acontecendo “mediante a arrecadação mais que ilícita, criminosa, de recursos públicos e privados para aliciar partidos políticos e corromper parlamentares e líderes partidários”.
Os dois votos, e mais o de Marco Aurélio Mello, deram a maioria do plenário à tese de que o que houve foi a compra de apoio político, e não caixa dois eleitoral, tese que só o revisor Ricardo Lewandowski abraçou explicitamente.
Até mesmo Dias Toffoli, que nos tempos em que trabalhava para o PT disse que o mensalão “ainda está para ser provado”, admitiu que houve compra de votos no caso do PL. Joaquim Barbosa, Luiz Fux e Gilmar Mendes foram taxativos quanto à compra de votos, e Rosa Weber aderiu à tese de modo indireto: disse que seguia integralmente o voto do relator.
Mas o mais importante do dia foi mesmo o voto de Celso de Mello, pelo enquadramento do objeto do julgamento na ótica da preservação da República.
Ao votar a favor do crime de quadrilha, ele ampliou a interpretação, equiparando a “ameaça à paz social” feita pelos bandidos à insegurança provocada por “esses vergonhosos atos de corrupção parlamentares profundamente levianos quanto à dignidade e à respeitabilidade do Congresso Nacional”.
O decano defendeu que tais atos “devem ser condenados e punidos com o peso e o rigor das leis desta República”, pois “afetam o cidadão comum, privando-o de serviços essenciais, colocando-os à margem da vida”.
Esses atos “significam tentativa imoral e ilícita de manipular criminosamente, à margem do sistema funcional, o processo democrático, comprometendo-o”.
Ele fez questão de sublinhar a gravidade da situação ao definir como especialmente culpados “aqueles que ostentam ou ostentaram funções de governo”. Para ele, tal atividade “maculou o próprio espírito republicano”.
Sem referência explícita, Celso de Mello, no entanto, deixou claro o que pensa do governo que abrigou tal esquema de corrupção: “(...) Este processo criminal revela a face sombria daqueles que, no controle do aparelho de Estado, transformaram a cultura da transgressão em prática ordinária e desonesta de poder, como se o exercício das instituições da República pudesse ser degradado a uma função de mera satisfação instrumental de interesses governamentais ou desígnios pessoais”.
Para exemplificar o que considera como o oposto do que ocorreu no país, Celso de Mello recorreu ao professor Celso Laffer, segundo quem, "numa República, o primeiro dever do governante é o senso de Estado, vale dizer, o dever de buscar o bem comum e não o individual ou de grupos”.
Mello disse que “o cidadão tem o direito de exigir que o Estado seja dirigido por administradores íntegros e por juízes incorruptíveis”.
Em algumas ocasiões de sua fala, apontava para o alto ao se referir às altas esferas do Poder Público que estariam envolvidas no esquema criminoso: “(...) quem tem o poder e a força do Estado em suas mãos não tem o direto de exercer (o governo) em seu próprio proveito”.
Com a definição de que houve compra de apoio político num esquema sofisticado, com o objetivo de distorcer o funcionamento da democracia brasileira em favor do Executivo, o Supremo parte agora para a definição de quem arquitetou tamanho plano – de que são acusados os petistas José Dirceu, José Genoino e Delúbio Soares – e, sobretudo, quem entre eles detinha o “domínio do fato”.

Mensalão: Fragmentos do histórico voto de Celso de Mello - 30ª sessão

 


Fragmentos do voto proferido pelo eminente Ministro Celso de Mello na AP 470/MG, sessão plenária de 01/10/2012

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Entendo que o Ministério Público expôs na peça acusatória eventos delituosos revestidos de extrema gravidade e imputou aos réus ora em julgamento ações moralmente inescrupulosas e penalmente ilícitas que culminaram, a partir de um projeto criminoso por eles concebido e executado, em verdadeiro assalto à Administração Pública, com graves e irreversíveis danos ao princípio ético-jurídico da probidade administrativa e com sério comprometimento da dignidade da função pública, além de lesão a valores outros, como a integridade do sistema financeiro nacional, a paz pública, a credibilidade e a estabilidade da ordem econômico-financeira do País, postos sob a imediata tutela jurídica do ordenamento penal.

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Quero registrar, neste ponto, Senhor Presidente, tal como salientei em voto anteriormente proferido neste Egrégio Plenário, que o ato de corrupção constitui um gesto de perversão da ética do poder e da ordem jurídica, cuja observância se impõe a todos os cidadãos desta República que não tolera o poder que corrompe nem admite o poder que se deixa corromper.

Quem transgride tais mandamentos, não importando a sua posição estamental, se patrícios ou plebeus, governantes ou governados, expõe-se à severidade das leis penais e, por tais atos, o corruptor e o corrupto devem ser punidos, exemplarmente, na forma da lei.

Este processo criminal revela a face sombria daqueles que, no controle do aparelho de Estado, transformaram a cultura da transgressão em prática ordinária e desonesta de poder, como se o exercício das instituições da República pudesse ser degradado a uma função de mera satisfação instrumental de interesses governamentais e de desígnios pessoais.

Fácil constatar, portanto, considerados os diversos elementos legitimamente produzidos nestes autos e claramente demonstrados pelo eminente Relator, que a conduta dos réus, notadamente daqueles que ostentam ou ostentaram funções de governo, não importando se no Poder Legislativo ou no Poder Executivo, maculou o próprio espírito republicano.

Em assuntos de Estado e de Governo, nem o cinismo, nem o pragmatismo, nem a ausência de senso ético, nem o oportunismo podem justificar, quer juridicamente, quer moralmente, quer institucionalmente, práticas criminosas, como a corrupção parlamentar ou as ações corruptivas de altos dirigentes do Poder Executivo ou de agremiações partidárias.

Extremamente precisa a observação, sempre erudita, do Professor Celso Lafer, quando, ao discorrer sobre o espírito republicano, acentua, a partir de Montesquieu, que “o princípio que explica a dinâmica de uma República, ou seja, o sentimento que a faz durar e prosperar, é a virtude. É nesse contexto que se pode dizer que a motivação ética é de natureza republicana. Isso passa (...) pela virtude civil do desejo de viver com dignidade e pressupõe que ninguém poderá viver com dignidade numa comunidade política corrompida”.

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É por isso, Senhores Ministros, que a concepção republicana de poder mostra-se absolutamente incompatível com qualquer prática governamental tendente a restaurar a inaceitável teoria do Estado patrimonial.

Com o objetivo de proteger valores fundamentais, Senhor Presidente, tais como se qualificam aqueles consagrados nos princípios da transparência, da igualdade, da moralidade e da impessoalidade, o sistema constitucional instituiu normas e estabeleceu diretrizes destinadas a obstar práticas que culminem por patrimonializar o poder governamental, convertendo-o, em razão de uma inadmissível inversão dos postulados republicanos, em verdadeira “res domestica”, degradando-o, assim, à condição subalterna de instrumento de mera dominação do Estado, vocacionado, não a servir ao interesse público e ao bem comum, mas, antes, a atuar como incompreensível e inaceitável meio de satisfazer conveniências pessoais e de realizar aspirações governamentais e partidárias.

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O fato é um só, Senhor Presidente: quem tem o poder e a força do Estado, em suas mãos, não tem o direito de exercer, em seu próprio benefício, a autoridade que lhe é conferida pelas leis da República.

A gravidade da corrupção governamental, inclusive aquela praticada no Parlamento da República, evidencia-se pelas múltiplas consequências que dela decorrem, tanto aquelas que se projetam no plano da criminalidade oficial quanto as que se revelam na esfera civil (afinal, o ato de corrupção traduz um gesto de improbidade administrativa) e, também, no âmbito político-institucional, na medida em que a percepção de vantagens indevidas representa um ilícito constitucional, pois, segundo prescreve o art. 55, § 1º, da Constituição, a percepção de vantagens indevidas revela um ato atentatório ao decoro parlamentar, apto, por si só, a legitimar a perda do mandato legislativo, independentemente de prévia condenação criminal.

A ordem jurídica, Senhor Presidente, não pode permanecer indiferente a condutas de membros do Congresso Nacional – ou de quaisquer outras autoridades da República – que hajam eventualmente incidido em censuráveis desvios éticos e reprováveis transgressões criminosas, no desempenho da elevada função de representação política do Povo brasileiro.

Sabemos todos que o cidadão tem o direito de exigir que o Estado seja dirigido por administradores íntegros, por legisladores probos e por juízes incorruptíveis.

O direito ao governo honesto – nunca é demasiado reconhecê-lo – traduz uma prerrogativa insuprimível da cidadania.

A imputação, a qualquer membro do Congresso Nacional, de atos que importem em transgressão ao decoro parlamentar revela-se fato que assume, perante o corpo de cidadãos, a maior gravidade, a exigir, por isso mesmo, por efeito de imposição ética emanada de um dos dogmas essenciais da República, a repulsa por parte do Estado, tanto mais se se considerar que o Parlamento recebeu, dos cidadãos, não só o poder de representação política e a competência para legislar, mas, também, o mandato para fiscalizar os órgãos e agentes dos demais Poderes.

Vê-se, nesse ponto, a íntima correlação entre a própria Constituição da República, em face de que prescreve o seu art. 55, § 1º, e a legislação penal.

Qualquer ato de ofensa ao decoro parlamentar, como a aceitação criminosa de suborno, culmina por atingir, injustamente, a própria respeitabilidade institucional do Poder Legislativo, residindo,nesse ponto, a legitimidade ético-jurídica do procedimento constitucional de cassação do mandato parlamentar, em ordem a excluir, da comunhão dos legisladores, aquele – qualquer que seja – que se haja mostrado indigno do desempenho da magna função de representar o Povo, de formular a legislação da República e de controlar as instâncias governamentais do poder.

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Importante destacar, Senhor Presidente, as gravíssimas consequências que resultam do ato indigno (e criminoso) do parlamentar que comprovadamente vende o seu voto e que também comercializa a sua atuação legislativa em troca de dinheiro ou de outras indevidas vantagens.

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A corrupção deforma o sentido republicano de prática política, compromete a integridade dos valores que informam e dão significado à própria ideia de República, frustra a consolidação das instituições, compromete a execução de políticas públicas em áreas sensíveis como as da saúde, da educação, da segurança pública e do próprio desenvolvimento do País, além de afetar o próprio princípio democrático.

Daí os importantes compromissos internacionais que o Brasil assumiu em relação ao combate à corrupção, como o evidencia a subscrição, por nosso País, da Convenção Interamericana contra a Corrupção (celebrada na Venezuela em 1996) e da Convenção das Nações Unidas (celebrada em Mérida, no México, em 2003).

As razões determinantes da celebração dessas convenções internacionais (uma, de caráter regional, e outra, de projeção global) residem, basicamente, na preocupação da comunidade internacional com a extrema gravidade dos problemas e das consequências nocivas decorrentes da corrupção para a estabilidade e a segurança da sociedade, eis que essa prática criminosa enfraquece as instituições e os valores da democracia, da ética e da justiça, além de comprometer a própria sustentabilidade do Estado democrático de direito, considerados os vínculos entre a corrupção e outras modalidades de delinquência, com particular referência para a criminalidade organizada, a delinquência governamental e a lavagem de dinheiro.

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Esses vergonhosos atos de corrupção parlamentar, profundamente lesivos à dignidade do ofício legislativo e à respeitabilidade do Congresso Nacional, alimentados por transações obscuras idealizadas e implementadas em altas esferas governamentais, com o objetivo de fortalecer a base de apoio político e de sustentação legislativa no Parlamento brasileiro, devem ser condenados e punidos com o peso e o rigor das leis desta República, porque significam tentativa imoral e ilícita de manipular, criminosamente, à margem do sistema constitucional, o processo democrático, comprometendo-lhe a integridade, conspurcando-lhe a pureza e suprimindo-lhe os índices essenciais de legitimidade, que representam atributos necessários para justificar a prática honesta e o exercício regular do poder aos olhos dos cidadãos desta Nação.

Esse quadro de anomalia, Senhor Presidente, revela as gravíssimas consequências que derivam dessa aliança profana, desse gesto infiel e indigno de agentes corruptores, públicos e privados, e de parlamentares corruptos, em comportamentos criminosos, devidamente comprovados, que só fazem desqualificar e desautorizar, perante as leis criminais do País, a atuação desses marginais do Poder."










quinta-feira, 27 de setembro de 2012

PEQUENO MANUAL SOBRE ELEIÇÕS, ELABORADO POR QUINTUS TULLIUS, GENERAL E POLITICO NO ANO 64 A. C.

Em 64 a.C., Cícero, notável orador e político romano, embora não pertencente à aristocracia de onde saíam os que iriam dirigir os destino de Roma, apresentou-se como candidato ao posto de cônsul, o cargo mais importante na cena política de Roma. Seu irmão Quintus Tullius, general e político, produziu um memorando que denominou Pequeno Manual sobre Eleições, com o objetivo de ajudar o candidato na campanha que se aproximava e, como tudo parecia indicar, não iria ser nada fácil para o tribuno.



A revista Foreign Affairs publicou em maio/junho passado trechos do memorando de Quintus Tullius, que, pela sua atualidade diante do quadro das eleições municipais no País inteiro, tendo como pano de fundo o julgamento do mensalão, merecem ser aqui resumidos.
Os conselhos nele contidos podem surpreender pelo cinismo e pelo pragmatismo, mas mostram que os costumes e as práticas políticas não se modificaram substancialmente desde esses remotos tempos romanos. Em mais de 2 mil anos nada, ou quase, parece ter mudado. Os políticos mais experientes pouco terão a ganhar com o manual. Os iniciantes, contudo, poderão beneficiar-se de alguma das sugestões feitas para a conquista do sufrágio e do apoio dos eleitores.
O memorando aponta as duras e cruas realidades da política e oferece um roteiro pragmático ao candidato. Primeiro, prestando conselho sobre como ganhar a eleição; em seguida, analisando a natureza e a força da sua base política, além da necessidade de dar atenção a grupos específicos; e, finalmente, oferecendo uma série de conselhos práticos sobre como conquistar votos.

Segundo Quintus Tullius, são três as coisas que podem garantir votos numa eleição: favores, esperança e relações pessoais. E segue dizendo ao irmão: "Você deve trabalhar para dar esses incentivos às pessoas certas. Para ganhar os eleitores indecisos você pode fazer-lhes pequenos favores. Com relação àqueles em quem você desperta a esperança - uma grupo zeloso e devotado -, deve fazê-los acreditar que estará sempre ao seu lado para ajudá-los. Deixe que eles saibam que você está agradecido por sua lealdade e que está muito agradecido pelo que cada um deles está fazendo por você. Em relação aos que já o conhecem, você deve encorajá-los, adaptando a sua mensagem à circunstância de cada um e demonstrando a maior gratidão pelo apoio de seus seguidores. Para cada um desses três grupos de apoiadores, decida como eles podem ajudá-lo na campanha. E de que modo você pode pedir coisas a eles. Não deixe de dar atenção a cada um individualmente, de acordo com a sua dedicação à campanha.

Em cada vizinhança existem determinados cidadãos que exercem poder e podem ser pessoas-chave para a campanha. É necessário distinguir esses homens daqueles que parecem importantes, mas que não têm poder real. Reconhecer a diferença entre as pessoas úteis e as inúteis em qualquer organização evitará que você invista o seu tempo e recursos em pessoas que serão de pouca ajuda para você.

O candidato deve ser um camaleão, adaptando-se a cada indivíduo que ele encontra e deve mudar sua expressão e seu discurso quando necessário.

Mantenha por perto os seus amigos. E seus inimigos mais perto ainda. Depois de identificar quais os amigos com os quais poderá contar, dê atenção a seus inimigos. Ha três tipos de pessoas que poderão opor-se aos seus interesses: aquelas a quem você contrariou, as que não gostam de você e as que são amigas próximas de seus oponentes.

Para impressionar os eleitores, dê atenção a cada um deles, sendo pessoal e generoso. Nada impressiona mais um eleitor do que o candidato não se ter dele esquecido. Por isso, faça um esforço para lembrar-se de seus nomes e rostos.

Faça promessas de todo o tipo. As pessoas preferem uma mentira de conveniência a uma recusa direta. Prometa qualquer coisa a qualquer um, a menos que uma clara obrigação ética o impeça de fazê-lo.

A campanha deve ser competente, digna, mas cheia de vida e de espetáculo, o que tanto atrai as massas. Também não fará mal se você os lembrar de quão desqualificados são seus oponentes, acusando-os de crimes, escândalos sexuais e corrupção em que poderão estar envolvidos.

O mais importante numa campanha é incentivar a esperança no povo e criar nele um sentimento de boa vontade em relação a você. Por outro lado, você não deve fazer promessas específicas, quer para o Senado, quer para o povo. Fique em vagas generalidades: diga ao Senado que você vai manter os privilégios e poderes que tradicionalmente tiveram; deixe a comunidade de negócios e os mais ricos saberem que você é favorável à estabilidade e à paz; assegure ao povo que você sempre esteve ao seu lado, tanto em seus discursos como na defesa de seu interesse.

Onde quer que você ande, haverá de encontrar arrogância, teimosia, malevolência, orgulho e ódio. Não se deixe desencorajar pela conversa de corrupção. Mesmo nas eleições mais corruptas há muitos eleitores que apoiam os candidatos em quem eles acreditam, sem receber em troca nenhum pagamento. É possível que seus oponentes tentem usar o suborno para ganhar o apoio dos que estão com você. Deixe que eles saibam que você estará observando atentamente as suas ações e os ameace com processo nos tribunais. Eles ficarão com medo de sua influência no meio empresarial. Não será necessário levá-los aos tribunais com acusações de corrupção; o importante é que eles saibam que você está disposto a isso. O medo funciona melhor do que uma ação judicial. O que interessa não é o resultado da ação dos tribunais, mas a ameaça é importante como um instrumento para produzir o medo e a moderação dos adversários".

Cícero foi eleito...
E assim vem caminhando a humanidade.

terça-feira, 25 de setembro de 2012

"Adeus, Lula, por Marco Antonio Villa

 


Transcrevo o esplêndido artigo de MARCO ANTONIO VILLA publicado no Globo desta terça-feira.
A presença constante no noticiário de Luís Inácio Lula da Silva impõe a discussão sobre o papel que deveriam desempenhar os ex-presidentes. A democracia brasileira é muito jovem. Ainda não sabemos o que fazer institucionalmente com um ex-presidente. Dos quatros que estão vivos, somente um não tem participação política mais ativa. O ideal seria que após o mandato cada um fosse cuidar do seu legado. Também poderia fazer parte do Conselho da República, que foi criado pela Constituição de 1988, mas que foi abandonado pelos governos ─ e, por estranho que pareça, sem que ninguém reclamasse.
Exercer tão alto cargo é o ápice da carreira de qualquer brasileiro. Continuar na arena política diminui a sua importância histórica ─ mesmo sabendo que alguns têm estatura bem diminuta, como José Ribamar da Costa, vulgo José Sarney, ou Fernando Collor. No caso de Lula, o que chama a atenção é que ele não deseja simplesmente estar participando da política, o que já seria ruim. Não. Ele quer ser o dirigente máximo, uma espécie de guia genial dos povos do século XXI. É um misto de Moisés e Stalin, sem que tenhamos nenhum Mar Vermelho para atravessar e muito menos vivamos sob um regime totalitário.
As reuniões nestes quase dois anos com a presidente Dilma Rousseff são, no mínimo, constrangedoras. Lula fez questão de publicizar ao máximo todos os encontros. É um claro sinal de interferência. E Dilma? Aceita passivamente o jugo do seu criador. Os últimos acontecimentos envolvendo as eleições municipais e o julgamento do mensalão reforçam a tese de que o PT criou a presidência dupla: um, fica no Palácio do Planalto para despachar o expediente e cuidar da máquina administrativa, funções que Dilma já desempenhava quando era responsável pela Casa Civil; outro, permanece em São Bernardo do Campo, onde passa os dias dedicado ao que gosta, às articulações políticas, e agindo como se ainda estivesse no pleno gozo do cargo de presidente da República.
Lula ainda não percebeu que a presença constante no cotidiano político está, rapidamente, desgastando o seu capital político. Até seus aliados já estão cansados. Deve ser duro ter de achar graça das mesmas metáforas, das piadas chulas, dos exemplos grotescos, da fala desconexa. A cada dia o seu auditório é menor. Os comícios de São Paulo, Salvador, São Bernardo e Santo André, somados, não reuniram mais que 6 mil pessoas. Foram demonstrações inequívocas de que ele não mais arrebata multidões. E, em especial, o comício de Salvador é bem ilustrativo. Foram arrebanhadas ─ como gado ─ algumas centenas de espectadores para demonstrar apoio. Ninguém estava interessado em ouvi-lo. A indiferença era evidente. Os “militantes” estavam com fome, queriam comer o lanche que ganharam e receber os 25 reais de remuneração para assistir o ato ─ uma espécie de bolsa-comício, mais uma criação do PT. Foi patético.
O ex-presidente deveria parar de usar a coação para impor a sua vontade. É feio. Não faça isso. Veja que não pegou bem coagir: 1. Cinco partidos para assinar uma nota defendendo-o das acusações de Marcos Valério; 2. A presidente para que fizesse uma nota oficial somente para defendê-lo de um simples artigo de jornal; 3. Ministros do STF antes do início do julgamento do mensalão. Só porque os nomeou? O senhor não sabe que quem os nomeou não foi o senhor, mas o presidente da República? O senhor já leu a Constituição?
O ex-presidente não quer admitir que seu tempo já passou. Não reconhece que, como tudo na vida, o encanto acabou. O cansaço é geral. O que ele fala, não mais se realiza. Perdeu os poderes que acreditava serem mágicos e não produto de uma sociedade despolitizada, invertebrada e de um fugaz crescimento econômico. Claro que, para uma pessoa como Lula, com um ego inflado durante décadas por pretensos intelectuais, que o transformaram no primeiro em tudo (primeiro autêntico líder operário, líder do primeiro partido de trabalhadores etc, etc), não deve ser nada fácil cair na real. Mas, como diria um velho locutor esportivo, “não adianta chorar”. Agora suas palavras são recebidas com desdém e um sorriso irônico.
Lula foi, recentemente, chamado de deus pela então senadora Marta Suplicy. Nem na ditadura do Estado Novo alguém teve a ousadia de dizer que Getúlio Vargas era um deus. É desta forma que agem os aduladores do ex-presidente. E ele deve adorar, não? Reforça o desprezo que sempre nutriu pela política. Pois, se é deus, para que fazer política? Neste caso, com o perdão da ousadia, se ele é deus não poderia saber das frequentes reuniões, no quarto andar do Palácio do Planalto, entre José Dirceu e Marcos Valério?
Mas, falando sério, o tempo urge, ex-presidente. Note: “ex-presidente”. Dê um tempo. Volte para São Bernardo e cumpra o que tinha prometido fazer e não fez. Lembra? O senhor disse que não via a hora de voltar para casa, descansar e organizar no domingo um churrasco reunindo os amigos. Faça isso. Deixe de se meter em questões que não são afeitas a um ex-presidente. Dê um bom exemplo. Pense em cuidar do seu legado, que, infelizmente para o senhor, deverá ficar maculado para sempre pelo mensalão. E lá, do alto do seu apartamento de cobertura, na Avenida Prestes Maia, poderá observar a sede do Sindicato dos Metalúrgicos, onde sua história teve início. E, se o senhor me permitir um conselho, comece a fazer um balanço sincero da sua vida política. Esqueça os bajuladores. Coloque de lado a empáfia, a soberba. Pense em um encontro com a verdade. Fará bem ao senhor e ao Brasil.

sexta-feira, 21 de setembro de 2012

Piazza San Marco, Veneza Bizâncio em Veneza: A Basílica de São Marcos - Parte II



Obra de arquitetura essencialmente bizantina, mas com traços românicos, góticos e renascentistas, a Basílica de São Marcos é inesquecível.

Muito se tem escrito sobre essa extraordinária construção e aqui vamos fazer uma pequeníssima descrição. Não é uma aula, é mais um momento para alegrar nosso espírito e despertar a curiosidade dos mais jovens em procurar ler sobre Veneza e suas joias.

Hoje é dia de falar do interior da Basílica, do seu esplendor. Não há um milímetro sem um mosaico, uma pintura, uma decoração de tirar o fôlego. Logo no vestíbulo, ficamos extasiados. Palavra, há qualquer coisa de estonteante ao sair da praça e entrar nesse espaço - um soco definiria bem, se não fosse um local de culto religioso... Vejam a primeira imagem abaixo: os mosaicos que falam da Criação.

quarta-feira, 19 de setembro de 2012

Praça de São Marcos, Veneza, Itália



No alto do terraço duas grandes estátuas em bronze batem no sino para marcar as horas. Nomeados pastores por seu escultor, em 1494, o que combina com a pele de carneiro que cobre sua nudez, ficaram conhecidos como “os mouros”: alguns estudiosos dizem que isso foi para mostrar que havia escravos mouros em Veneza, aprisionados nas muitas guerras travadas por motivo religioso.


O sino onde batem cada um com seu martelo é o original e data de 1497. Os dois mouros não são iguais: o de barba é o mais velho dos dois. O velho bate o sino um pouco antes da hora, é o passado. O novo, o futuro, bate um pouco depois. Logo abaixo do terraço dos mouros em sua labuta está o leão alado de Veneza sobre fundo azul veneziano, salpicado de estrelas em ouro, com o Livro de São Marcos Evangelista aberto diante dele.
No andar de baixo, as imagens do Anjo Gabriel seguido dos Reis Magos saem e entram em procissão, duas vezes ao ano, Dia de Reis e Dia da Ascensão, para reverenciar Maria e o Menino Jesus, cuja imagem fica num pequeno balcão semicircular.


E finalmente, o quadrante do relógio, em mármore, esmalte e ouro, com as 24 horas do dia em algarismos romanos. O engenhoso aparelho mostra as horas, as estações do ano, as fases da Lua e os cinco planetas então conhecidos: Saturno, Júpiter, Marte, Vênus e Mercúrio.

As horas são indicadas por um ponteiro dourado enfeitado por uma imagem do sol. Os signos do zodíaco giram mais lentamente que o ponteiro para mostrar a posição do sol no zodíaco. No centro do mostrador esmaltado em azul ficam a terra e a lua que gira para mostrar suas fases, cercadas por estrelas sempre na mesma posição.

No alto do terraço duas grandes estátuas em bronze batem no sino para marcar as horas. Nomeados pastores por seu escultor, em 1494, o que combina com a pele de carneiro que cobre sua nudez, ficaram conhecidos como “os mouros”: alguns estudiosos dizem que isso foi para mostrar que havia escravos mouros em Veneza, aprisionados nas muitas guerras travadas por motivo religioso.


O sino onde batem cada um com seu martelo é o original e data de 1497. Os dois mouros não são iguais: o de barba é o mais velho dos dois. O velho bate o sino um pouco antes da hora, é o passado. O novo, o futuro, bate um pouco depois. Logo abaixo do terraço dos mouros em sua labuta está o leão alado de Veneza sobre fundo azul veneziano, salpicado de estrelas em ouro, com o Livro de São Marcos Evangelista aberto diante dele.
No andar de baixo, as imagens do Anjo Gabriel seguido dos Reis Magos saem e entram em procissão, duas vezes ao ano, Dia de Reis e Dia da Ascensão, para reverenciar Maria e o Menino Jesus, cuja imagem fica num pequeno balcão semicircular.


E finalmente, o quadrante do relógio, em mármore, esmalte e ouro, com as 24 horas do dia em algarismos romanos. O engenhoso aparelho mostra as horas, as estações do ano, as fases da Lua e os cinco planetas então conhecidos: Saturno, Júpiter, Marte, Vênus e Mercúrio.

segunda-feira, 17 de setembro de 2012

Piazza San Marco: A Piazzeta e as Procuradorias


O coração veneto bate em Veneza e o de Veneza bate na Piazza San Marco.
Definida por Napoleão como o mais belo salão de festas da Europa, rodeado de obras-primas, visitar
San Marco é um prazer inesquecível. Vamos começar pelo “portão” que dá acesso ao salão para quem vem do mar: a Piazzeta San Marco (foto abaixo), na verdade um prolongamento da grande praça, bem na margem do Canal Grande, e que tem de um lado o Palácio dos Doges e do outro a Libreria Sansoviniana, que abriga a Biblioteca Marciana.




Ali estão as duas colunas de granito originárias de Constantinopla: no topo de uma delas está a estátua de São Teodoro e no da outra, o leão de São Marcos.
Mas é ao atravessar a Piazzeta que entramos na praça monumental tendo, à direita de quem entra, o Palácio dos Doges, em seguida a Basílica. Os outros três lados são fechados pelas Procuradorias Velha, a Novíssima, dita Napoleônica, e a Nova. No ângulo formado com a Piazzeta e a Nova, fica o Campanário.
Sem discordar que a Piazza San Marco parece um belo salão de baile, gosto também de compará-la a um teatro: as três Procuradorias cercam a “platéia” que dá para o “palco” onde estão, em esplendor, o Palácio Ducal e a Basílica.
As Procuradorias são imponentes edifícios que têm esse nome porque ali se alojavam os Procuradores de São Marcos, o mais prestigiado cargo vitalício da República de Veneza, que só deviam obediência ao Doge. O primeiro procurador foi nomeado no século IX para cuidar da construção e administração da Basílica; em 1442, já eram nove os procuradores que formavam o Conselho Maior.
A Procuradoria Velha fica ao norte da praça; a Nova, ao sul; e a Novíssima, a oeste. A Velha mede 152 metros desde a Torre do Relógio até a Novíssima. Tem 50 arcadas que correspondem a 100 janelas nos dois andares superiores. A original, do século XII, foi destruída pelo fogo e a que vemos hoje é do século XVI.
A Nova foi iniciada em 1582 e respeita o desenho arquitetônico da primeira, o que colabora para a harmonia da praça. Ficou pronta em 1640. Já o edifício da Novíssima tem uma origem pouco nobre... Ali ficava, entre dois prédios, a Igreja de San Geminiano, uma das mais antigas de Veneza e da qual já se tinha notícia no século VI. Pois foi por vontade de um filho de Josefina, Eugênio, que se demoliu a igreja para unir as duas construções e assim fechar o “salão mais belo” com a ala Novíssima, ou "Napoleônica".
As três Procuradorias hoje abrigam nos andares superiores diversos museus, e a diretoria dos Museus Cívicos Italianos. Sob as belas arcadas, lojas de arte, joalherias e cafés, entre eles o inacreditável Caffè Florian, de 1720, ainda em funcionamento. Sentar numa das mesas externas do Florian e ficar olhando longamente a praça é um presente de Deus. Sente e agradeça.


Na imagem acima, a praça vista por Canaletto (1730) desde a Igreja de San Geminiano, que ficava onde hoje está a Procuradoria Novíssima. (à esquerda a Procuradoria Velha e à direita, a Nova)

sábado, 15 de setembro de 2012

O MENSALÃO E O VIOLINO

                                                                                                                                 Guilherme Fiúza


A elite suja e reacionária deste país está aplicando mais um golpe contra o PT. Este foi o alerta dado pelo presidente do partido, Rui Falcão. Ele ficou indignado com a condenação de João Paulo Cunha, no STF, por corrupção passiva e peculato.
Com a perspectiva de que outros réus do partido tenham o mesmo destino no julgamento do mensalão, Falcão ameaçou: “Não mexam com o PT, porque quando o PT é provocado ele cresce, reage.”
Reage mesmo. E reage com patriotismo. Por sorte, o Sete de Setembro estava chegando, proporcionando mais uma ótima ocasião para Dilma Rousseff falar diretamente ao seu povo, sem passar pela mídia burguesa — que, segundo Falcão, é uma das agentes do golpe, junto com o Judiciário e outros vilões da elite suja.
O golpe é contra o operário e a mulher que mudaram este país. Mas a mulher reagiu no Dia da Independência.
Dilma só disse coisas boas em cadeia nacional de rádio e TV. O melhor do seu pronunciamento, porém, foi o fundo musical. Com a sutileza própria dos revolucionários, que endurecem sem perder a ternura, entraram na comunicação presidencial um violino choroso e um piano adocicado, ornando com perfeição o melodrama dos oprimidos, que resistem firmes ao golpe dos reacionários.
Pronunciamento oficial com fundo musical é um dos maiores avanços trazidos pelo governo do PT. Era o que estava faltando aos nossos governantes: um pouco mais de emoção — especialmente naquele horário, logo antes da novela.
Dilma e Lula não têm tido gancho para chorar em público, mas o violino chorou maravilhosamente por eles, numa versão romântica do Hino da Independência.
Bem que o presidente do PT avisou para não mexer com eles.
Num pronunciamento oficial com toques de showmício, evidentemente o que é falado é o menos importante. E está certo que seja assim. Ninguém vai querer que o telespectador, contando os minutos para ver Carminha, fique prestando atenção na numeralha do Brasil-potência que o PT construiu.
E isso é ótimo, porque só o que faltava era esperarem que a presidente, com todo o trabalho de cabeleireiro, cenografia e trilha sonora, ainda tivesse que dizer coisa com coisa.
Como diz o Hino da Independência, já raiou a liberdade no horizonte do Brasil — inclusive a liberdade de dizer a essa brava gente o que lhe der na telha. Foi desse jeito livre que Dilma Rousseff anunciou uma redução nas tarifas de energia, naturalmente sem mencionar que devia R$ 7 bilhões aos brasileiros por cobranças indevidas nas contas de luz. Mas isso não combinaria com piano e violino.
Também aproveitou a liberdade no horizonte para não dizer que a bondade elétrica do governo popular vai lhe custar R$ 21 bilhões.
A outra boa notícia é que o governo não passa cheque sem fundo: o contribuinte cobre tudo. E cobre feliz, ao som de violino e à luz da economia que ele acha que vai fazer.
Provavelmente foi por isso que Dilma encerrou seu pronunciamento de Sete de Setembro dizendo “viva o povo brasileiro”. Talvez pudesse arrematar com um “Deus lhe pague”.
Viva o povo que aprova o governo do PT, e o protege desses golpes da elite suja e da mídia conservadora. Lula e José Dirceu também prometem reagir, denunciando à OEA o atentado aos direitos dos réus do mensalão.
De fato, é preciso proteger os seus direitos de ir e vir entre os cofres públicos e a caixinha do partido. Se a OEA, a Anistia Internacional e outros organismos progressistas tiverem dúvida, é só prestarem atenção às palavras do ministro Ricardo Lewandowski. Ele já declarou aos seus colegas do Supremo que está em curso um julgamento “heterodoxo”. Ou seja: um julgamento muito estranho, talvez suspeito.
Lewandowski e Dias Toffoli, os ministros heterodoxos com amizades ortodoxas na corte petista, estão dando o melhor de si. Votaram pela absolvição de João Paulo Cunha e vão tentando aliviar o sócio de Marcos Valério que pode ligá-lo a Dirceu. É confortante saber que essas vítimas da elite suja não estão desamparadas. País limpo é país sem sujeira.
O ideal seria que o julgamento do mensalão fosse todo transmitido por boletins da presidente em cadeia nacional, com violino. A mídia golpista ia ver o que é bom para tosse — e para as eleições.
O importante é isso: não deixar que a elite suja desmascare os companheiros limpos, e assim golpeie sua imaculada máquina eleitoral.
Se o eleitorado desconfiar que o país caminha apesar de um governo parasita e perdulário, pode querer desalojar os companheiros de suas cadeiras públicas — o que seria um grave problema social.
O currículo da própria presidente não deixa dúvidas: não se sabe o que seria dessa brava militância sem a bênção do voto (e do emprego que dele emana).
A heroína argentina já está ouvindo panelaços. O tango da viúva melodramática começou a desafinar. Por aqui, a trilha sonora do oprimido, por incrível que pareça, continua dando para o gasto.


AINDA SOBRE O MENSALÃO

                                                                                                                  Tarcísio Brandão de vilhena
 
Talvez muitos ainda não saibam, mas ministros do Supremo Tribunal Federal - como regra geral- levam vidas discretíssimas, e deles, a esmagadora maioria da população ignora até os nomes. Entretanto, com o julgamento do mensalão, estão sendo reconhecidos e aplaudidos em restaurantes, shopping centers e parques públicos em Brasília.
A começar, pelo que se poderia prever, pelo severo relator do caso, ministro Joaquim Barbosa.
O vento purificador que, até agora, vem soprando desde o Supremo Tribunal Federal no trato implacável que a maioria de seus ministros tem conferido ao processo do mensalão faz sentir seus efeitos.
Repito, para alguns leitores apressados: A MAIORIA de seus ministros. Não todos.
Não sei como terminará o julgamento. Ainda falta muita coisa — muitas acusações a serem comprovadas, muitos réus a serem escrutinados, muitas horas de trabalho dos ministros.
Mas, sem querer parecer otimista, ouso dizer que uma condenação rigorosa de altos figurões da República, como se esboça, possa ser um divisor de águas num país que há décadas vem melhorando em quase todos os setores, em quase todos os indicadores sociais e econômicos — mas que ainda chafurda na miséria moral da impunidade dos poderosos, no escárnio dos que roubam o dinheiro público, na empáfia de quem frauda e assalta o alheio sorrindo, de gente capaz de falsificar remédio para câncer a fim de ganhar dinheiro sabendo que não vai para a cadeia, ou de matar pelas costas uma ex-namorada, ser réu confesso e ainda assim, com advogadões, conseguir permanecer dez anos em liberdade após ser condenado antes de, finalmente, ser encerrado numa cela.
















quarta-feira, 12 de setembro de 2012

MALHOA, Pinturas - Retratos: Laura, Clara e o mestre-escola

 

No apogeu das reuniões do Grupo do Leão, Malhoa começa também a se interessar por retratos. O que lhe atraía era tentar capturar o espírito de seu modelo, seu pensamento e em suas telas retratar a alma portuguesa. Veremos alguns desses retratos durante esta semana.


Começamos com o de uma menina, Laura, pintada em 1888. A tela faz parte do acervo do Museu José Malhoa, erguido em Caldas da Rainha, terra natal do artista. Muitos anos depois, em 1950, a retratada, já com o nome de casada, Laura Sauvinet Bandeira, doou seu retrato ao museu e dizem que na ocasião ela deixou escapar: “Eu era muito bonita!”.

É a obra mais conhecida de Malhoa. E só podemos concordar com Laura – ela era mesmo bonita.

Sua expressão serena, seu olhar tranquilo não mostram, no entanto, o que registros escritos deixaram como testemunho: a ansiedade da jovem para que as horas de pose, cansativas e maçantes, terminassem logo... O que é mais do que natural numa menina de 12 anos.




É um belo retrato: a paleta de cores muito bem escolhida, a pele luminosa, os lindos cabelos e o porte elegante. Nas mãos as flores que seriam muitas vezes pintadas por Malhoa, as hortênsias. Mas o que mais chama a atenção é o jogo de luz e sombra que ele tão bem utilizou, o que era uma marca de suas telas.

Pouco tempo depois, Malhoa adquire casa de campo em Figueiró dos Vinhos, no distrito de Leiria. Ali, além de figuras que ama retratar, redescobre os temas populares que o encantarão ao longo da vida. O Portugal sentimental e bucólico, o mesmo que Eça retrata em A Cidade e as Serras, quando Jacinto de Thormes troca Paris pela aldeia serrana.

Um exemplo é o retrato de Clara, a linda aldeã que transmite vitalidade e bom humor. Foi pintado em 1918.

Segundo registros do museu, Malhoa viu em Clara uma das personagens do romance As Pupilas do Senhor Reitor, de Julio Dinis.



(detalhe)



São muito diferentes as duas meninas-moças. Laura é mais jovem, mas Clara não deve ter ainda 20 anos. Vidas díspares, uma citadina, a outra camponesa, mas são as duas muito representativas das moças portuguesas. É só passar uma temporada por lá que encontraremos Claras e Lauras, não com as mesmas vestes, nem nas mesmas posições. Mas os rostos, a expressão, o olhar, a feminilidade, isso que Malhoa captou tão bem, esses ainda são os mesmos.

E por último o mestre-escola: junto a uma janela aberta sobre uma paisagem rural e luminosa, ele lê o jornal. Como sempre, é o domínio da luz que impressiona em Malhoa. A luz natural de um dia de verão se contrapõe à luz interior que com certeza não permitia que o mestre-escola lesse com vagar o seu jornal.




 

terça-feira, 11 de setembro de 2012

Portugal e Brasil nos pincéis de Malhoa

 
Maria Helena Rubinato Rodrigues de Sousa -

Os temas históricos sempre interessaram ao pintor. Recebeu o 1.º prêmio no Concurso para Quadro Histórico promovido pela Câmara Municipal de Lisboa com a “A Partida de Vasco da Gama para a Índia”.

E aqui no Rio, numa viagem feita em 1906, a convite do Real Gabinete Português de Leitura, ele realiza duas obras que remetem aos estreitos laços que nos unem a Portugal. Ambas pertencem à pinacoteca daquela biblioteca.

São duas de suas mais belas telas. Primeiro falo da que retrata o Infante D. Henrique, um dos filhos de d. João I de Portugal, fundador da Dinastia de Avis, e de Filipa de Lencastre – os pais da chamada ínclita geração, que bem merece esse título.

Do sonho e da fé desse homem extraordinário saíram as viagens marítimas que desbravaram o mundo...

A tela “representa Dom Henrique sentado no desvão de um cachopo, no Promontório de Sagres. Contempla o espadanar das ondas nos rochedos, como se estivesse a estudar o regime dos ventos e os mistérios do mar. Na irisação formada pelas espumas contra o sol e no recorte das nuvens vê a concretização do seu grande sonho: “o sonho bendito que haveria de dar novos mundos ao mundo” (do site do Real Gabinete Português de Leitura)




Deus quere, o homem sonha, a obra nasce.
Deus quiz que a terra fosse toda uma,
Que o mar unisse, já não separasse.
Sagrou-te, e foste desvendando a espuma,

E a orla branca foi de ilha em continente,
Clareou, correndo, até ao fim do mundo,
E viu-se a terra inteira, de repente,
Surgir, redonda, do azul profundo.

Quem te sagrou creou-te portuguez.
Do mar e nós em ti nos deu signal.
Cumpriu-se o Mar, e o Imperio se desfez.
Senhor, falta cumprir-se Portugal!

(Mensagem: Mar Portuguez, O Infante – Fernando Pessoa)


A outra tela é sobre a chegada de Cabral ao Brasil. E começo pela descrição de Pero Vaz sobre o primeiro escambo e sobre a tranquila soneca do gigante adormecido:

(...)Viu um deles umas contas de rosário, brancas; acenou que lhas dessem, folgou muito com elas, e lançou-as ao pescoço. Depois tirou-as e enrolou-as no braço e acenava para a terra e de novo para as contas e para o colar do Capitão, como dizendo que dariam ouro por aquilo.

Isto tomávamos nós assim por assim o desejarmos. Mas se ele queria dizer que levaria as contas e mais o colar, isto não o queríamos nós entender, porque não lho havíamos de dar. E depois tornou as contas a quem lhas dera.

Então estiraram-se de costas na alcatifa, a dormir, sem buscarem maneira de cobrirem suas vergonhas, as quais não eram fanadas; e as cabeleiras delas estavam bem rapadas e feitas. O Capitão lhes mandou pôr por baixo das cabeças seus coxins; e o da cabeleira esforçava-se por não a quebrar. E lançaram-lhes um manto por cima; e eles consentiram, quedaram-se e dormiram.





É um quadro que desperta minha curiosidade. Explico: a mim me parece que nosso Cabral não tem o ar feliz de quem atinge seu objetivo depois de tantas provações. Tem um ar meio aborrecido... Seria essa a intenção de Malhoa? Mas vejam bem, isso é a opinião de uma palpiteira...



domingo, 9 de setembro de 2012

Javier Arizabalo, pintor hiperrealista

 



javier-arizabalo-01
O francês de Saint-Jean-de-Luz Javier Arizabalo, pintor hiperrealista, demonstra em sua obra um olhar carinhoso para a velhice (veja as reproduções no final do post), mas é para as mulheres que guarda a maior porção de sua delicadeza.
Esculpe, com pincéis, corpos – nus – e tudo o que fazem parte de seu universo: sentimentos, esperanças, sonhos e prazeres.
Sua obra ostenta dupla entrega: a do próprio pintor, que dá vida a um imaginário latente, vívido, prazeirento e lânguido, e a do modelo, que confia que seu reflexo espelhe o que de melhor tem a oferecer.
Nas suas palavras: “A “arte” ou o “fazer” são por e para a vida humana; como tudo o que é real, o são por “razões” (sentido, vontade…). Faz tempo que utilizo a arte para curar-me, alimentar-me; resolvo os desejos a partir das imagens que re-presento, é maravilhoso”.
Arizabalo é um daqueles artistas que, por alguma razão, não dá títulos a seus quadros. Isso, naturalmente, não muda a qualidade de seu trabalho.

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sexta-feira, 7 de setembro de 2012

LOGGIA DEI LANZIGGIA-FLORENÇA-ITÁLIA

 FIGURAS HISTÓRICAS E MITOLÓGICAS NA LINDA "LOGGIA"


Como já dissemos, são 13 as estátuas abrigadas sob a Loggia dei Lanzi. Já falamos das três mais renomadas e que não ocupam essa posição por nenhum outro motivo senão o da excelência de sua execução: Perseu e a cabeça da Medusa, de Cellini, e O Rapto das Sabinas e Hércules e o Centauro, de Giambologna.

As outras estátuas que completam o rico acervo da Loggia, são O Rapto de Polixena, de Pio Fedi, Menelau e Patroclo, cujo autor é desconhecido, mas que é uma relíquia romana, os dois leões já mencionados e seis figuras femininas, em mármore branco, que ficam junto à parede do fundo.


Acima detalhe de uma das cinco Sabinas que podemos ver na Loggia. Não se sabe ao certo se é da época de Trajano ou de Adriano. Encontrada em Roma, em 1541 ou 1584, sabe-se com certeza que está em Florença desde 1787 e na Loggia desde 1789.

A estátua Romana de Menelau e Patroclo (foto abaixo) tem uma história polêmica. Alguns historiadores dizem que foi descoberta num vinhedo a menos de um quilômetro de Roma; outros que foi encontrada em meio às ruínas do Fórum de Trajano. (Resumir o episódio da Ilíada que envolve Patroclo, Aquiles e Menelau é um tour de force acima de minhas forças. Por isso o link).

O que se sabe sobre essa obra ao certo é que pouco antes de 1570, Cosimo I de Médici a comprou e obtida a permissão do papa Pio V, a levou para Florença. A primeira menção oficial à estátua está justamente no testamento de Cosimo I, de 1574.






Ela ficou anos numa das pontas da Ponte Vecchio. Depois disso, no decorrer de mais de dois séculos, passou por inúmeras restaurações até ser colocada na Loggia dei Lanzi. Apesar da restauração de um dos braços de Patroclo ser objeto de muitas críticas e do elmo de Menelau não ser em absoluto igual aos desenhos da época em que chegou a Florença, ainda assim é uma das maiores atrações da Loggia por sua origem Romana e por representar um dos mais pungentes episódios da Ilíada de Homero.

O Rapto de Polixena, de 1865, (imagem abaixo) é obra de Pio Fedi. O desespero de Hécuba diante do corpo do filho morto ao ver sua filha Polixena ser raptada a mando de Aquiles, o assassino de seu filho, pode ser sentido nessa estátua magnífica que conta outro episódio do poema de Homero.






Aqui um breve resumo: Polixena é filha de Hécuba e do rei de Tróia; Aquiles mata seu irmão Troilus diante dela; depois, ele se apaixona por ela. Louco de paixão, resolve raptá-la; foi nesse convívio forçado que ela descobriu o único ponto fraco de Aquiles: seu calcanhar é vulnerável e ela conta o segredo a Paris. O resto da história, só em livros sobre mitologia grega ou lendo Homero...

Mas depois me digam se uma visita à Loggia não é o máximo


terça-feira, 4 de setembro de 2012

A Nudez Feminina, a intimidade, a água ---na pintura hiperrrealista da americana, Alissa Monks

 

OS LEÕES QUE PROTEGEM FLORENÇA

 


Recordando: construída entre 1376 e 1382, a Loggia era um centro cívico, onde os cidadãos da República de Florença se reuniam para debater e resolver os problemas da cidade e também nas ocasiões públicas mais solenes, como posse dos governantes.

Chamada de Loggia della Signoria por estar situada ao lado do palácio do governo, o Palazzo Vecchio, ao abrigar temporariamente, em 1527, os Lanzicheneschi, soldados mercenários do Sacro Império Romano, passou a ser chamada de Loggia dei Lanzi, nome pelo qual ficou mais conhecida.

Quando a República é derrubada, e a cidade passa a ser regida pelo Grão-Ducado da Toscana e as instituições republicanas são definitivamente suprimidas, a arcada passa a acolher estátuas de muito valor e com isso torna-se o primeiro museu público do mundo.

A 'loggia' é um ponto de encontro em Florença, uma pausa para os viajantes e um lugar de contemplação para os apaixonados por esculturas. Essa é uma cidade onde a beleza está em toda a parte, mas a Loggia dei Lanzi, com seus tesouros à disposição de quem por ali passa, é um dos locais mais queridos da cidade.

Reparem nos leões ao lado dos degraus de acesso, os dois protetores de Florença. São duas fantásticas obras. O da direita é uma relíquia romana. O da esquerda é obra de Flamino Vacca, de 1600. Esses animais simbolizam guarda e proteção contra presenças negativas, segundo tradição iconográfica herdada de civilizações mesopotâmicas.


ao fundo, janelas e balcões da Galleria degli Uffizi




O grão-duque tomou o cuidado de zelar para que só fossem enviadas para a Loggia obras que tivessem um vínculo com a história de Florença. Perseu foi escolhido por dois motivos: a magnificência da obra e o gesto do herói, decapitando a experiência republicana na cidade, simbolizada pela cabeça da Medusa.

As mais expressivas estátuas obedeceram ao mesmo critério: representarem a vitória do grão-ducado, que significava ordem, contra a anarquia republicana: essa a força dos duques junto aos habitantes de Florença.






Em 1583, quando as obras no palácio dos Uffizi terminaram, o arquiteto Bernardo Buontalenti teve a feliz ideia de criar, no alto da Loggia, um terraço do qual era possível assistir às várias cerimônias e espetáculos que aconteciam na linda Piazza della Signoria. Para proteção dos espectadores, colocou um gradil circundando o terraço.

Hoje lá está um café para os felizes visitantes dessa apaixonante cidade.



 


segunda-feira, 3 de setembro de 2012

FLORENÇA E A SUA EXTRAORDINÁRIA GALERIA ABERTA SOBRE A PRAÇA


Seu nome é Loggia della Signoria, é mais conhecida como Loggia dei Lanzi, mas para os florentinos é simplesmente a 'loggia'. Monumento histórico situado na Piazza della Signoria, praça central e coração de Florença, à direita do Palazzo Vecchio (sede do poder civil) e vizinha da Galleria degli Uffizi (o Museu de Belas Artes que foi ateliê e oficina de artistas artesãos).






Loggia significa galeria, arcada aberta. A loggia de Florença recebeu o nome Lanzi porque ali acamparam os Lanzichenecchi, ou soldados mercenários que serviam ao Sacro Império Romano. O termo é derivado do alemão Landsknecht (Land = terra + Knecht = servidor). Eles ali se abrigaram em 1527, a caminho de Roma, e a Loggia passou a ser chamada de Loggia dei Lanzi, numa abreviação do nome alemão.

Construída entre 1376 e 1382, por ser local coberto, servia para a realização de assembleias públicas e cerimônias oficiais da República. Não tem um estilo definido. Poderia ser considerada gótica se não fossem as arcadas renascentistas.

Quando caiu a República, e foi criado o Grão Ducado da Toscana, e ela passou a não mais servir como centro de assembleias dos cidadãos, deram-lhe a destinação de abrigar obras de arte. Isso fez da Loggia um dos primeiros espaços de exposição publica do mundo.

São treze as esculturas que se pode contemplar de perto a qualquer hora do dia e da noite e sem comprar ingresso... São belíssimas, mas sem dúvida a mais famosa é Perseu com a cabeça da Medusa (1545/1554), também conhecida como o Perseu de Cellini, a primeira das estátuas ali colocadas e a única encomendada expressamente para o local.






Considerada a obra prima do verdadeiro joalheiro-escultor Benvenuto Cellini, a escultura, em bronze, está colocada no alto de um pedestal todo esculpido pelo grande artista. Perseu segura a cabeça da Medusa pelos cabelos e olha para baixo, em direção ao espectador. Com a mão esquerda empunha a espada curva que lhe foi dada por Mercúrio, de quem é protegido.

O pedestal, por segurança removido dali no século XX e substituído por uma cópia, é outra obra-prima: os pequenos bronzes que o adornam representam divindades ligadas ao mito de Perseu. O original está seguro no Bargello, museu de esculturas, também em Florença.

O Perseu de Cellini, depois de uma restauração prolongada, voltou a ficar em exposição na Loggia dei Lanzi e é obra que merece toda a atenção de quem se interessa pela difícil arte da escultura: é perfeita.